Antes mesmo do início dos trabalhos legislativos, a Câmara Municipal de São Paulo já vê uma atuação predominantemente ideológica de seus novos vereadores. Enquanto os parlamentares da direita se voltam contra direitos LGBTQIA+ e movimentos de luta por moradia, a esquerda marca posição propondo a exibição do filme “Ainda Estou Aqui” nas escolas e IPTU maior para ricos.
Nas primeiras três semanas da nova legislatura, além de 29 projetos de lei, foram protocolados três requerimentos para a instauração de CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito), dois deles repetidos. Lucas Pavanato (PL) e Amanda Vetorazzo (União) conseguiram assinaturas para investigar a invasão de imóveis, enquanto o mesmo vereador colheu apoios para uma CPI sobre a distribuição de seringas como forma de redução de danos na cracolândia.
“Queremos investigar invasões de terreno, mas principalmente de prédios no centro de São Paulo. Além de prejudicar a segurança, muitos ladrões usam as invasões para pegar celulares. Consegui as 19 assinaturas no dia primeiro e já protocolei”, conta Amanda.
Os dois vereadores oriundos do MBL chegaram à Câmara com projetos já prontos. Logo no primeiro dia de mandato, Amanda também protocolou projeto prevendo multa de de 2.950 UFESP (Unidade Fiscal do Estado de São Paulo), mais de R$ 70 mil, a quem “praticar o ato de invasão de propriedade, esbulho e turbação de posse de qualquer bem imóvel público ou privado” na cidade.
O projeto, assim com a CPI, mira o MTST, movimento de moradia ligado a Guilherme Boulos (PSOL), segundo colocado nas duas últimas disputas para prefeito na capital paulista.
Pavanato, vereador mais votado no ano passado, também já se voltou contra o esbulho e a turbação de posse de um imóvel. Pelo projeto dele, uma subprefeitura passaria a ser obrigada, em 30 dias após receber denúncia, a realizar a integração de posse, sem a necessidade de qualquer decisão judicial ou administrativa reconhecendo a invasão.
Segundo ele, a ideia é punir a invasão de imóveis, não outras formas de esbulho, como a inadimplência do aluguel. “O projeto da reintegração de posse visa única e exclusivamente lidar com imóveis que foram invadidos. Ele está aberto para possíveis modificações. A ideia é fiscalizar esses imóveis que hoje são invadidos por pessoas que não têm o direito de ocupá-los. Para a pessoa que deixou de pagar um aluguel já existem disposições legais e meu projeto não visa abordar essas disposições”, afirmou à Folha.
De nove projetos apresentados pelo jovem vereador neste início de ano, quatro têm como alvo os direitos da população LGBTQIA+, especialmente a transgênero. Ele propõe o “sexo biológico” como único critério para definição de gênero competições esportivas na cidade e de uso de banheiros em espaços coletivos e a proibição de tratamentos hormonais em menores de 18 anos.
Ele diz cumprir promessa de campanha e defender as mulheres. “O eleitor votou em mim porque prometi que abriria uma CPI de invasões na cidade de São Paulo; prometi que tentaria proteger nossas crianças de terapias hormonais que têm consequências nocivas para a saúde delas.”
Entre os projetos dele, que rompeu com o MBL e se reconhece bolsonarista, está também o “Prêmio Olavo de Carvalho de Defesa da Família”, a ser entregue pela Câmara anualmente no aniversário de nascimento do autointitulado filósofo, que morreu em 2022, para reconhecer iniciativas a favor da família e da Igreja.
Também do PL, Sonaira Fernandes, outra do núcleo bolsonarista, já fez isso apresentação uma moção de aplauso aos grupos que, no entender dela, “defendem a fé cristã” realizando rodas de orações durante os intervalos escolares.
Apresentou também uma moção de repúdio a uma resolução da Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) que fixa diretrizes para o atendimento de menores de idade em casos de aborto legal e diz que “toda criança e adolescente tem direito a ter acesso a informações sobre seu próprio corpo que permitam a identificação e a denúncia de situações de violência sexual”.
Bem menos ativa na apresentação de projetos neste momento do ano em que não há sessões, a esquerda também já marcou posição. Celso Giannazi (PSOL) sugeriu, por indicação, que o filme “Ainda Estou Aqui” seja exibido em todos os espaços públicos de exibição cinematográfica de responsabilidade do município como forma de “revisitar os anos de ditadura militar”.
“Essa lembrança é essencial para que os erros do passado sejam compreendidos e jamais se repitam”, justificou, sobre o filme dirigido por Walter Salles que concorre ao Oscar deste ano em três categorias, incluindo a de Melhor Filme.
Já Luana Alves (PSOL) no projeto de lei número 01 do ano, propôs que imóveis residenciais de valor venal acima de R$ 7 milhões paguem o dobro de IPTU do que pagam atualmente. O imposto extra iria para o SUS.
“Os impostos castigam ainda mais os trabalhadores todo início de ano, isso precisa mudar. É preciso combater desigualdades. A demanda foi trazida por apoiadores do mandato, trabalhadores da saúde. Queremos que os bilionários paguem mais e ajudem a equilibrar a balança, além de ampliar o financiamento público da saúde e outras áreas sociais”, defendeu a vereadora.