O que bispa Budde e Nikolas Ferreira têm em comum? – 28/01/2025 – Cotidiano

Nos últimos dias, com a posse de Donald Trump, vimos como a república americana, mesmo sem ter uma religião oficial, é profundamente religiosa. Dois eventos envolvendo mulheres e profecias chamaram a atenção, cada um por razões distintas, em meio às cerimônias do novo mandato de Trump.

A primeira profecia veio da bispa Mariann Edgar Budde, que exortou o recém-eleito presidente dos Estados Unidos ao arrependimento. Ela pediu compaixão pelos imigrantes e pela comunidade LGBTQIA+. Trump reagiu com desprezo, criticando o sermão da bispa como “sem inteligência” e exigindo um pedido de desculpas públicas.

A segunda profecia envolve o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). Em um vídeo que circulou muito entre evangélicos brasileiros, ele aparece com a ativista política e reverenda Eve Nunez, que o presenteia com um convite para o Baile de Celebração da posse de Trump.

A reverenda o abençoa e o encoraja a continuar na política. Em seguida, outra mulher faz uma profecia mais específica: Nikolas se tornaria presidente do Brasil.

Embora diferentes, os dois casos são tratados como profecias. Para um cristão, profecia quer dizer “uma palavra direta de Deus”. O tipo mais conhecido em alguns círculos evangélicos é aquele que revela acontecimentos futuros. Contudo, na Bíblia, essa é apenas uma das formas de profetizar, e nem é a mais importante.

Profecias políticas, como a recebida por Nikolas, têm se tornado frequentes nos últimos anos, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil. Exemplos incluem as profecias sobre a reeleição de Trump em 2020, de Bolsonaro em 2022 ou, anteriormente, a eleição de Marina Silva em 2014. Nenhuma delas se concretizou.

Isso invalida a prática de profecias sobre o futuro na fé cristã? No livro de Deuteronômio (18:22), Deus orienta o povo a discernir: se uma profecia não se cumpre, não foi Deus quem falou, e o conselho é para ignorá-la.

Diversos profetas bíblicos, como Isaías e João Batista, usaram suas palavras para confrontar governantes corruptos e chamar ao arrependimento, especialmente em relação à opressão dos mais vulneráveis (Isaías 1:4; 5:8; Lucas 3:14).

A bispa Budde, seguindo essa tradição, pediu que o presidente reconsiderasse políticas que aumentarão o sofrimento dos desfavorecidos. Ao confrontar o presidente, ela enfrenta possíveis consequências, assim como os profetas bíblicos que desafiavam reis sem se preocupar com sua reputação.

Em contraste, a profecia direcionada a Nikolas Ferreira parece mais conveniente politicamente do que espiritualmente. Em vez de confrontar o poder, ela enalteceu um político e produziu aplausos. Nas redes sociais, seus apoiadores torcem pelo cumprimento dessa previsão.

Movimentos cristãos, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, frequentemente ignoram a gravidade de falar em nome de Deus. Como mostram as experiências recentes, é prudente julgar profecias com base nas escrituras e na coerência de seu propósito. Afinal, o uso irresponsável dessas palavras pode transformar o que deveria ser sagrado em ferramenta de poder e manipulação.

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