Ampliar a inserção de mestres e doutores em setores para além da academia é um dos desafios a serem enfrentados pelo país nos próximos anos, segundo o Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) 2025-2029 que a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) deve publicar ainda neste semestre.
Para impulsionar o ingresso de mais titulados em áreas diversas, a presidente do órgão, Denise Pires de Carvalho, planeja implementar um estágio obrigatório no setor produtivo, de modo semelhante à exigência do estágio-docência, para os pós-graduandos de todos os formatos de curso do stricto sensu —seja acadêmico, seja profissional.
“Com isso, passaremos para a segunda fase de desenvolvimento da pós-graduação brasileira, marcada pela interação com o setor produtivo de forma curricular e estimulada pela agência de fomento, como Jorge Guimarães [então presidente da Capes] fez em 2010 [com a portaria nº 76, que regula o Programa de Demanda Social e institui o estágio-docência], povoando nossas universidades e institutos federais com mestres e doutores formados pelo Sistema Nacional de Pós-Graduação”, diz Carvalho.
A educação foi a principal área de atuação de mestres (37,7%) e doutores (72%) com emprego formal no país em 2021, de acordo com o estudo “Brasil: Mestres e Doutores 2024”, do CGEE (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos) com dados da Capes e da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), do Ministério do Trabalho e Emprego. A maior parte dos profissionais desse setor (57,7% dos mestres e 83% dos doutores) trabalhava no ensino superior.
O incentivo ao diálogo entre as empresas e as universidades também é parte das estratégias para atrair mais alunos. Isso porque, na avaliação da presidente, o sistema enfrentou uma crise causada pela pandemia e pelo subfinanciamento sob a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) —em 2022, por exemplo, o governo retirou R$ 1,2 bilhão do FNDCT (Fundo Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Os dados da Capes mostram que, entre 2020 e 2022, o total de ingressantes na pós-graduação diminuiu nas nove grandes áreas do conhecimento. Sete segmentos registraram aumento em 2023, mas nenhum recuperou ou superou os maiores patamares do período pré-pandemia.
Já as engenharias, as ciências agrárias, as ciências biológicas e as ciências exatas e da Terra apresentavam queda contínua desde 2018 e 2019 —uma consequência, afirma Carvalho, da redução do investimento nas bolsas e nos projetos da Capes e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Eduardo Matos, chefe da assessoria de estratégia da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), também aponta a diminuição do orçamento —tanto das universidades quanto da própria Embrapa— como uma possível justificativa para a redução da quantidade de novos alunos nas ciências agrárias.
Job Vieira, analista e supervisor da área de inteligência estratégica da empresa, afirma que, por ser impactado por desafios como emergência climática, mudança nos sistemas alimentares, transição energética e transformação digital, o campo oferece cada vez mais oportunidades aos titulados.
Entre 2010 e 2021, segundo o estudo do CGEE, o emprego total de mestres e doutores cresceu, respectivamente, 7,2% e 8,9% ao ano. A área da agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura têm índices próximos da média, de 7,5% para mestres e 9,2% para doutores.
Como caminhos para aumentar a quantidade de ingressantes em cursos de pós-graduação das ciências agrárias, Vieira e Matos defendem o investimento em infraestrutura e o aumento da quantidade e do valor das bolsas concedidas. Vieira também sugere o acréscimo de disciplinas que conversem com a ciência de dados, a fim de contemplar tecnologias como a agricultura de precisão e o uso de drones, sensores e inteligência artificial na coleta e análise de informações.
Ambos apoiam o estágio proposto por Carvalho, da Capes. “A formação na pós-graduação deve estar orientada para atender as demandas do mundo do trabalho como um todo —da indústria, do setor produtivo, do empreendedorismo—, e não só voltada à pesquisa e à docência. Assim, o estudante tem a segurança de que ele entrará no mercado e terá diversas oportunidades”, diz Matos.