Carregando fitas azuis e brancas e atirando flores para o alto, a multidão caminha pelas ruas do centro de Porto Alegre para se reencontrar com um dos mais esperados eventos religiosos da capital gaúcha: a procissão de Nossa Senhora dos Navegantes.
A festa começou depois das 8h deste domingo (2), tendo como tema “150 anos, caminhando com Maria, Mãe da Esperança” e foi a primeira desde a catástrofe climática de 2024.
“Fui para a casa dos meus pais no litoral e não tinha voltado a Porto Alegre desde a enchente. Morava naquele prédio ali”, aponta a dona de casa Maiara Lemos, 42.
O apartamento no pequeno edifício próximo à rodoviária da cidade agora está para alugar. “Não consigo pensar em voltar a viver de novo ali, mas tomei coragem e vim agradecer por poder recomeçar.”
Após uma missa às 7h, os fiéis deixaram a igreja Nossa Senhora do Rosário, no centro da cidade, acompanhando a imagem, carregada em um pequeno barco de madeira enfeitado com flores. Eles desceram a rua Vigário José Inácio e levantaram seus buquês enquanto atravessavam a avenida Mauá.
Ligadas pelo sincretismo, Nossa Senhora dos Navegantes e Iemanjá são homenageadas, a partir de uma lei municipal em Porto Alegre, com um feriado conjunto no dia 2 de fevereiro.
“Uma cidade que busque o bem viver e a igualdade racial tem o dever de reconhecer e respeitar também o sincretismo religioso”, disse em 2023 a vereadora Fran Rodrigues (PSOL), autora do projeto.
“A procissão faz parte da nossa história e é patrimônio imaterial de Porto Alegre. Depois das enchentes de maio do ano passado, esta tradição religiosa celebra a reconstrução e o futuro da nossa cidade e do povo gaúcho, que tem muita fé e coragem”, disse a secretária municipal da Cultura, Liliana Cardoso Duarte.
Fé foi o que fez Guilherme Soares, 23, sair de casa neste domingo para vender fitas e toalhas com desenhos de Nossa Senhora dos Navegantes.
Dono de um carrinho de sanduíches na zona norte da cidade, ele tinha feito a promessa de trabalhar no dia da festa, caso conseguisse recuperar o meio de sustento da família.
“Quem vê os meus filhos brincando aqui não imagina o que enfrentamos, mas tudo passa e hoje é dia de comemorar e agradecer”, conta.
Quando a multidão começa a contornar os antigos armazéns e prédios residenciais baixos no bairro de Navegantes, já são quase 11h.
Os devotos, que caminharam cerca de seis quilômetros, agora começam a tomar a praça onde fica a igreja de Nossa Senhora dos Navegantes, um dos templos religiosos mais populares da capital, que terá missas ao longo de todo o domingo e ônibus gratuitos.
“Mais cedo, o padre nos pediu que rezássemos não só por nós ou pela família, mas também pela cidade, pedindo que Nossa Senhora abençoe nosso bairro. Acho que o dia de hoje representa isso, um reencontro com o vizinho, mas agora por um motivo mais alegre”, diz a aposentada Ruth Brás, 72.