Por que ‘Emilia Pérez’ é um filme tão ruim – 05/02/2025 – Thiago Amparo

O problema do filme “Emilia Pérez” não está (apenas) no racismo da atriz Karla Sofía Gascón em tuítes antigos —crítica a George Floyd, desprezo a muçulmanos e falas sobre Hitler. Duas afirmações aqui são verdadeiras: sim, cabe a Gascón responder por posicionamentos deploráveis e, sim, cabe questionar quantos homens cisgêneros emitem opiniões tão criticáveis e sequer sofrem quaisquer consequências. “Emilia Pérez” é um filme ruim pelos seus próprios deméritos, no entanto.

Na forma, o filme é horrível (um musical tragicômico e desrespeitoso sobre um tema que persiste como um trauma coletivo mexicano: os desaparecimentos forçados e a violência de gênero). Seria o equivalente a um musical filmado em Paris sobre o 11 de Setembro cujos principais atores são australianos.

No conteúdo, o filme é horrível por expor um enredo previsível e binário cujo clímax é —spoiler— a destruição física da transgeneridade da personagem principal por meio de sua mutilação e assassinato real e simbólico.

O diretor francês Jacques Audiard conseguiu a proeza de alçar uma atriz trans ao Oscar fazendo uma obra cuja narrativa é transfóbica ao insistir, no roteiro, a todo momento que a transição de gênero não passava de uma máscara para fuga.

De nada adiantam as únicas partes boas do filme —as inovações visuais e a atuação de Zoë Saldaña— se estas apenas corroboram ao invés de contrastar com sua mediocridade. “Emilia Pérez” não funciona como um musical pelas letras, melodias, e vozes sofríveis; tampouco funciona como uma ficção sobre o México abertamente ignorado pelo diretor em sua pesquisa, locação e escolha de atores. A Selena Gomez cabe o troféu Framboesa de Ouro pela atuação para a qual palavras fogem ao tentar descrevê-la.

“Emilia Pérez” ensina que representatividade sem conteúdo crítico mais reforça estereótipos que os dissipa; e nos lembra que se europeus se aventuram, como sempre fizeram, a contar histórias latino-americanas, seria bom antes estudar um pouco mais.


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