Fenômeno da última década, o crescimento das fanfarras no Carnaval do Rio de Janeiro, tipo de banda que sai às ruas com instrumentos de sopro, metais e bateria, levou a uma maior procura por aulas de música e instrumentos musicais.
Por outro lado, profissionais que tocam em blocos tradicionais da cidade criticam a qualidade musical de alguns cortejos. Segundo eles, isso se dá por causa da pouca experiência e comprometimento dos músicos amadores.
Na rua da Carioca, região do centro do Rio conhecida pelas lojas de instrumentos musicais, a procura por trompetes, trombones, saxofones e até as imensas tubas aumentou desde novembro, de acordo com lojistas.
Também cresceu a venda de acessórios como bocais e boquilhas, fundamentais para ajustar os instrumentos de sopro ao estilo do dono —tocá-los é um desafio à musculatura e respiração.
Um trompete novo, de entrada, pode custar a partir de R$ 4.000 em lojas, e saxofones comuns a partir de R$ 5.000.
“Aqui também aumenta a procura por instrumentos de percussão. É um festival de venda de tamborins”, afirma Miguel Santinoni, da Clave Nova, em Ipanema.
Blocos famosos, como Orquestra Voadora e Me Enterra na Quarta, oferecem oficinas de música ao longo do ano. O interessado se matricula, participa das aulas e, uma vez apto, passa a integrar a banda para o Carnaval.
O tubista e trombonista Pablo Beato é desde 2011 músico do Cordão da Bola Preta e de outros blocos de rua do Rio, além de diretor musical, maestro e responsável pelas oficinas do Me Enterra na Quarta. Cada aula tem cerca de 20 alunos.
“Os alunos das oficinas foram aprendendo e criando os próprios blocos e repertórios, o que aumentou o número de blocos com instrumentos de sopro e percussão. Para este Carnaval as oficinas já estão há um tempo lotadas, não há vagas. É impossível formar um músico para tocar no Carnaval em dois ou três meses.”
A folia carioca tem tradição de orquestras desde os tempos dos bailes, festas em clubes fechados. O surgimento das escolas de samba e dos blocos de embalo, que tocavam sambas e marchinhas, anulou por um tempo a presença de trompetes e trombones.
Mas o movimento das fanfarras, surgido há pouco mais de uma década nas ruas, trouxe de volta o som dos instrumentos de sopro. Boa parte desses blocos desfila pelo centro e zona sul. Tocam clássicos da música brasileira, como Gilberto Gil e Caetano Veloso, e não mais marchinhas.
Os cortejos costumam ter mais de cinco horas de duração, alguns sem destino definido, desfilando até a dispersão.
É um fenômeno restrito a certas regiões da cidade. “Nas zonas norte e oeste essa procura por aulas de música de sopro é mais difícil”, afirma Álvaro di Azevedo, tubista, professor e músico do bloco Céu na Terra.
“Ter um instrumento de sopro é muito caro e é preciso tempo para investir no estudo. Esse fenômeno fica mais concentrado no centro, inclusive porque o pessoal da zona norte que toca também vai para o centro.”
Beato afirma que parte dos novos blocos é formada somente por músicos amadores, sem experiência, o que tem, na sua avaliação, afetado a qualidade dos cortejos.
“Está faltando consciência nos músicos de Carnaval. São poucos os blocos com boa qualidade de som, isso tem me incomodado ultimamente. Não é porque estamos no Carnaval e vamos tocar uma marchinha, ou um samba, que vamos tocar de qualquer jeito.”