Para adolescentes e crianças, nativos digitais, a ideia de sair de casa sem o celular ou descarregar a bateria costuma ser mais angustiante do que para os adultos. Agora que os alunos voltaram às aulas, e a lei 15.100/2025 restringe o uso dos aparelhos nas escolas no Brasil, quero dar algumas dicas sobre como vencer o uso compulsivo do celular.
Existe uma palavra que classifica o medo de ficar sem celular: nomofobia. O termo, derivado da expressão inglesa “no mobile phone phobia”, reflete a dependência emocional das pessoas em relação a essa tecnologia. A nomofobia é um quadro de ansiedade excessiva experimentada por indivíduos privados de usar seus celulares — seja por falta de sinal, bateria ou outra restrição.
A preocupação com o uso compulsivo de celulares, especialmente em ambientes de ensino, é global. De acordo com a Unesco, 25% dos países já criaram leis que restringem o uso de celular nas escolas. Por isso, os responsáveis devem estar preparados para lidar com reclamações relacionadas à mudança das regras nesse início de ano letivo.
Muitos adolescentes dizem sentir ansiedade ao sair de casa sem o aparelho; outros verificam constantemente se o celular está no bolso ou rolam infinitamente o feed das redes sociais.
A nomofobia pode ser enfrentada com a introdução de hábitos simples na rotina da sua casa. Por exemplo, evite usar o celular durante as refeições, preferindo ter um tempo de conversa em família. Ensine seus filhos que, mesmo estando sozinhos à mesa, o celular deve ser deixado de lado. Isso o ajudará a ter uma relação mais consciente com a alimentação. Estimular seus filhos a que pratiquem um esporte também os ajuda a substituir o tempo que passam online por atividades saudáveis e que estimule a socialização.
Outra estratégia para vencer a compulsão das crianças e adolescentes é limitar o tempo de uso dos aplicativos no aparelho. Muitos pais não sabem que podem configurar ferramentas que controlam o tempo de tela, nem desativar as notificações para evitar distrações em momentos de estudos. Desligar o celular antes de dormir — ou deixá-los carregando fora do quarto dos seus filhos — também reduzirá a ansiedade gerada pelo uso compulsivo do celular, além de melhorar a qualidade do sono.
Tenho recebido no consultório pais de estudantes que já estão sofrendo com as novas medidas restritivas. Semana passada, João (nome fictício), de 13 anos, veio à consulta com sua mãe, dizendo que a nova regra não o deixava prestar atenção na aula. A maneira como falava sobre o que estava passando corresponde aos efeitos registrados da nomofobia.
Chorando, ele relatou sua angústia ao imaginar algo acontecendo em sua casa sem ele saber. Perguntei se, antes, ele acessava muito o celular enquanto estava na escola para se certificar que tudo estava bem. “Umas dez vezes por dia. Me alivia”, ele me disse.
Expliquei a João e à sua mãe que, sem o celular, ele encontraria novas formas de lidar com o desconforto de ficar desconectado. Isso reduziria a sua dependência de estimulação constante, e promoveria um bem-estar mais sustentável nele.
Anna Lembke, psiquiatra e professora da Universidade Stanford, deu uma entrevista ao jornal The New York Times neste mês de fevereiro. Segundo ela, a exposição excessiva a estímulos digitais está alterando a forma como nosso cérebro processa recompensas, nos tornando mais propensos às compulsões.
É natural os pais quererem satisfazer o desejo dos filhos. No entanto, não é saudável eles serem constantemente estimulados ao prazer. Como explica Lembke, é preciso encontrar um meio-termo entre a satisfação e a dor para restaurar o equilíbrio e não sobrecarregar o nosso sistema de recompensa.
As novas regras quanto ao uso de celular nas escolas brasileiras ajudarão a combater esse problema que muitos nem sequer sabem que seus filhos enfrentam. Alguns criticam as medidas restritivas alegando que o mundo mudou, e que a tecnologia faz parte da vida moderna. Mas não se trata de retroceder. Se a dependência excessiva do celular tem afetado a nossa saúde mental e as relações interpessoais, porque não repensar o seu uso?