Após apurar denúncias de antissemitismo por parte de alunos e professores, a Fundação São Paulo, mantenedora da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), afirmou que não identificou situações no âmbito institucional que justifiquem a aplicação de medidas disciplinares aos investigados.
A decisão foi publicadas nas redes sociais da mantenedora na tarde desta terça-feira (25). Na nota, a fundação afirma que é fiel à sua vocação de educar e repudia toda forma de discriminação e que a apuração aconteceu por meio do setor de integridade.
No fim do ano passado, uma reportagem da Folha mostrou que o mal-estar e os traumas provocados pelo ataque terrorista do Hamas e pela ofensiva de Israel na Faixa de Gaza, em outubro de 2023, tomaram parte da comunidade acadêmica da universidade.
A guerra aumentou a tensão do tema no campus. De um lado, certas manifestações de apoio ao povo palestino e críticas aos bombardeios de Israel foram tomadas como antissemitismo, isto é, como discursos de ódio aos judeus.
De outro, estudantes que se declararam sionistas, ou seja, que defendem o nacionalismo judeu e seu direito a um Estado, foram apontados como apoiadores dos ataques a Gaza.
As pressões levaram à abertura de uma sindicância pela mantenedora da PUC-SP para a apuração de denúncias de suposto antissemitismo contra estudantes e dois professores de relações internacionais, Reginaldo Nasser e Bruno Huberman.
Na nota divulgada pela fundação, a mantenedora diz que, durante as oitivas, docentes defenderam o direito de autodeterminação dos povos e o respeito aos direitos humanos de todos aqueles que vivem entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo, seja na forma de um, dois, ou mais Estados.
O professor Nasser lamenta a forma como o caso foi conduzido. Segundo ele, “a PUC sempre teve a característica de ser democrática e transparente e resolver conflitos por meio do diálogo, impresso pelo Dom Paulo Evaristo Arns. E tudo indica que isso está chegando ao fim”.
Ele defende que seja instituído um protocolo de discriminação que valha para todos, e não algo específico para um grupo. “Isso é até chocante porque no ano passado teve um episódio de atitudes racistas por parte de alunos da PUC e parece que está em processo”, diz Nasser.
Para o professor Huberman, a decisão da fundação, que não identificou antissemitismo por parte dos professores, “demonstra a tranquilidade com que nós conduzimos o processo”. “Desde o início, estávamos muito cientes de que não havíamos praticado nada, que eram acusações infundadas, e a decisão da fundação reafirma o compromisso histórico da PUC, com a liberdade de cátedra, com a liberdade de expressão, direitos assegurados pela Constituição.”
Ele afirma ainda que o episódio é importante para trazer à tona o debate sobre o antissemitismo contemporâneo, diante do que está acontecendo no Oriente Médio, “com objeção a toda forma de censura”.
“Nesse momento a censura perdeu, a tentativa de censura perdeu. No fundo, era isso que se tratava, não era uma acusação de antissemitismo, mas é uma tentativa de censura do nosso trabalho, do nosso grupo de estudos”, diz o professor.
Huberman ainda pontua que não vê a perseguição e racismo sofridos por estudantes árabes e muçulmanos da PUC sendo levados em consideração.
Diante da situação, a fundação instituiu um protocolo antidiscriminatório, que será anexado ao seu Código de Ética e que será de “cumprimento obrigatório para todos os que dela fazem parte”. Huberman critica a adoção, pelo novo protocolo, de parte da definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA, na sigla em inglês).
O conceito foi adotado por pelo menos cinco estados brasileiros desde 7 de outubro de 2023. O governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) e a prefeitura de Ricardo Nunes (MDB) adotaram a definição, que não tem caráter legal nem vinculativo. Segundo o IHRA, “o antissemitismo é uma certa percepção dos judeus, que pode ser expressa como ódio contra eles”.
Entre os exemplos citados pela aliança estão manifestações dirigidas ao Estado de Israel “concebido como uma coletividade judaica” ou como “um empreendimento racista”. Críticos dessa definição, dentro e fora da comunidade judaica, argumentam que ela prejudica o debate sobre o conflito entre israelenses e palestinos.
Huberman afirma que a definição de antissemitismo deveria ser mais precisa e não levar em consideração a IHRA, que, para ele, envolve outros parâmetros perigosos, como a liberdade de expressão e a liberdade de cátedra.