Calor leva a debate sobre horário do Carnaval de rua em SP – 16/02/2025 – Cotidiano

Com previsão de calor intenso durante o período de desfiles, o Carnaval de rua de São Paulo está inserido no debate sobre o impacto das mudanças climáticas na organização de eventos de massa ao ar livre.

Até o fim de março, quando se concentra a programação de desfiles de blocos de Carnaval, a capital paulista segue em alerta para temperaturas até 0,5ºC acima da média; para o restante do estado, as altas devem bater 1ºC a mais do que a média histórica, de acordo com o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).

Os riscos da exposição às altas temperaturas se somam à previsão de chuvas abaixo do esperado, segundo o Inmet.

Mesmo diante desse cenário, a pouco mais de uma semana do pré-Carnaval, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) segue sem definição sobre as atitudes em caso de eventos climáticos extremos nos dias de programação. “Em breve serão agendadas reuniões com os organizadores para discutir questões relacionadas ao contingente de foliões em dias chuvosos”, afirmou a prefeitura em nota. Ainda não há também resolução sobre a distribuição de água.

O acesso gratuito a água potável em grandes eventos é previsto em lei federal aprovada no ano passado, após a morte de Ana Clara Benevides, 23, durante show da Taylor Swift no Rio de Janeiro, em novembro de 2023. A sensação térmica no estádio Nilton Santos, local da apresentação, era de 60ºC, quando ela desmaiou e foi socorrida, mas não resistiu a uma parada cardiorrespiratória.

Grupo formado por cerca de 80 blocos reivindicou a criação de um gabinete de crise em carta aberta enviada à prefeitura na semana passada. Distribuição gratuita de água e mudanças de data e horário dos desfiles caso ocorram eventos climáticos extremos.

No ano passado, o bloco da cantora Pabllo Vittar teve que ser encerrado antes do previsto diante do calor intenso que fez dezenas de foliões passarem mal em meio à aglomeração na área em frente ao parque Ibirapuera. Bombeiros esguicharam água na multidão para amenizar o calor.

O professor da faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) Paulo Saldiva diz que a exposição ao calor intenso demanda do corpo mais água e energia para regular a temperatura e manter a umidade relativa do ar que entra nos pulmões em 95%. “A pessoa perde muita água através da respiração e por causa do suor.”

O organismo já começa a sofrer a perda de fluidos quando exposto a temperaturas acima de 30ºC e umidade baixa, em torno de 70%. “O corpo faz vasodilatação para trocar a temperatura com o meio externo, o que pode causar palpitação e tonturas”, explica o professor.

Em casos mais graves, a perda de líquidos afeta o funcionamento cardíaco e faz o coração aumentar o ritmo de bombeamento de sangue para compensar, o que pode levar a um quadro fatal de arritmia.

Por isso, ele recomenda que a programação carnavalesca paulistana se concentre nos períodos mais frescos do dia, no início da manhã ou no fim da tarde.

Essa prática ocorre no Rio de Janeiro, onde os megablocos, como são chamados os desfiles que atraem milhões de pessoas, começam às 7h, horário definido junto com órgãos municipais justamente para minimizar os efeitos do calor intenso. De 482 blocos cadastrados, 10 se encaixam nessa categoria.

A capital carioca também segue desde o fim do ano passado um protocolo que determina medidas, como cancelamento de eventos e suspensão de eventos ao ar livre, de acordo com uma escala de cinco níveis de calor.

Iniciativas como essa ainda são esparsas na maioria das cidades brasileiras, segundo Elcio Batista, coordenador do programa Cidades + 2ºC, do Insper. “Poucas cidades têm sistemas públicos para prevenção de catástrofes e treinamento de população”, diz.

Para fazer frente a esses eventos extremos, ele recomenda a criação de grupos com a participação de representantes das cidade e instituições para discutir a influência da questão climática nos eventos de grande porte, como o Carnaval de rua.

Ele ressalta que a formação de um comitê de planejamento é parte da solução para reduzir os riscos diante das mudanças do clima, com a definição de protocolos de segurança.

A flexibilização dos horários dos blocos é encarada pelo coordenador como uma maneira de pôr o tema em evidência. “As pessoas estão acostumadas a ir nesses horários, que se mostram os mais inapropriados pelas longas horas de exposição ao calor, provocando um desgaste acima do normal. O ideal seria testar horários alternativos e informar as pessoas com antecedência.”

Em São Paulo, a gestão Nunes determinou que a dispersão dos blocos deve ocorrer até as 19h, horário em que o Carnaval de rua deve ser encerrado na capital. Os blocos têm até cinco horas para iniciar e concluir os desfiles, incluindo duas horas para a concentração e a dispersão.

Com isso, a programação atrai o maior número de pessoas no período entre o fim da manhã e o começo da tarde, horas mais quentes do dia.

Em nota, a gestão Nunes disse que serão disponibilizados 20 postos de atendimento médico, além de tendas de triagem para avaliação médica, descanso e hidratação.

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