Folha deveria excluir a seção de comentários – 11/03/2025 – Mariliz Pereira Jorge

Em 2016, a Folha alterou as regras da seção de comentários, baniu apelidos e apenas assinantes com nome e sobrenome passaram a ter acesso. Foi uma medida necessária para qualificar o debate, ao mesmo tempo que prestigiava o leitor. Ao acabar com o anonimato dos comentaristas, o jornal conseguiu frear a agressividade quase exclusiva àqueles que se manifestavam sem identificação.

A discussão parecia ter se sofisticado e a transparência afastado os baderneiros, mas nada é tão ruim que não possa piorar. Na sequência, a interação foi fechada nas notícias de mortes como a da ex-primeira-dama Marisa Letícia, em 2017, da mãe da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2019, e voltou a ser bloqueada, em 2022, quando morreu a progenitora de Jair Bolsonaro e, alguns meses depois, o guru da extrema direita Olavo de Carvalho. Isso pode dar uma ideia do nível a que descemos.

Sou leitora assídua dos comentários, não apenas das minhas colunas, mas de todos os temas que me interessam. O ambiente digital com o carimbo Folha sempre me pareceu o lugar para encontrar a controvérsia saudável e necessária para o debate público e por me aproximar do leitor, com quem tenho compromisso e por quem nutro profundo respeito.

Há anos ouço para ficar longe desse espaço, o que ainda resisto, mas percebo que os responsáveis por opiniões fundamentadas desapareceram, em sua maioria, talvez em fuga pela barbárie. Deram vez aos que, mesmo plenamente identificados, agridem, assediam, difamam. Muitos seriam passíveis de ações, mas, sempre que o senso de justiça me provoca, me lembro de que Otavio Frias Filho defendia que jornalista não processa, é processado.

Se a finalidade da Folha é aproximar o leitor e promover uma discussão refinada, parece claro que o espaço já deixou de cumprir a função há tempos. Mesmo com a moderação, infelizmente necessária, baixaria e assédio têm sido confundidos com liberdade de expressão. Talvez esteja na hora de o jornal radicalizar e seguir o exemplo do The Guardian e do site de tecnologia Wired: excluir a seção de comentários em nome da civilidade.


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