A palavra identitário me dói fundo. Primeiro, porque é um jeito polido de tentar apontar erros de militâncias políticas ligadas a raça, gênero e sexualidade enquanto o verdadeiro e principal alvo são as políticas de diversidade e inclusão — estas também sujeitas a erros, mas inegavelmente fundamentais para a equidade nos mais diversos espaços. Segundo, porque quem faz seu uso se presume acima de toda e qualquer identidade, confirmando a necessidade das iniciativas diversidade.
Pessoas brancas também são racializadas. Homens também se enquadram num gênero. Heterossexuais fazem parte de uma variação das noções de sexualidade e afetividade. E esses marcadores formam identidades.
Como bem lembra Paul B. Preciado em seus escritos, sobretudo na coletânea “Um Apartamento em Urano”, instituições se aproveitam há séculos de marcadores identitários para criar separações. A criança nasce e a equipe de saúde lhe atribui um gênero, o cartório legitima, fica impresso num documento. A Igreja Católica só permite homens como grandes líderes, há uma clara separação. E aqui vou além do que discute Preciado e avanço nas questões raciais. A África do Sul, de Elon Musk, foi responsável por um dos regimes de separação entre negros e brancos mais cruéis de que se tem notícia.
Políticas de equidade e inclusão vêm justamente para reparar estragos que atravessam a história, e muitas destas ações estão centradas na iniciativa privada. Só que agora se pretende dar uma virada numa volta ao velho normal.
O movimento das grandes empresas de tecnologia ao endossar o presidente americano é identitário. Mark Zuckerberg, da Meta, disse com todas as letras que organizações do setor precisam de mais energia masculina. Parece que agora discutir gênero (o deles, claro) é importante.
A questão é que nem todo recorte identitário, e é isso que observo aqui, se enquadra como minoria. Mas parece ser justamente isso que essa gente vem tentando pautar. É como se o movimento “woke” (outra palavra usada de maneira esquisita) tivesse tirado o emprego de todos os homens héteros do mundo, substituindo-os por mulheres trans e homens gays. É um coitadismo dos mais impressionantes.
Ao fim e ao cabo, nos resta o riso —este ainda não privatizado por Musk. Dentre todas as atrocidades anunciadas por Donald Trump, (hoje o principal líder do identitarismo branco, hétero e rico), a mais eloquente da insanidade em que nos encontramos é voltar com os canudos de plástico. Danem-se, as tartarugas, essas chatas, identitárias. Chega de tartaruguismo woke!
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