Migrantes climáticos bengalis sofrem abusos no golfo Árabe – 24/02/2025 – Ambiente

As mudanças climáticas estão forçando cada vez mais bengalis a emigrar para o golfo Pérsico em busca de uma vida melhor, mas o sonho muitas vezes se transforma em uma realidade de abuso e exploração em condições semelhantes à escravidão, de acordo com um novo estudo.

“Pessoas vulneráveis, empurradas ao limite devido a choques climáticos, fazem uma grande aposta para pagar pela migração, mas muitas vezes acabam em uma situação onde enfrentam abusos”, disse Ritu Bharadwaj, uma das autoras do relatório.

A pesquisa com migrantes bengalis que se mudaram de áreas vulneráveis ao clima para trabalhar no golfo mostrou que quase todos enfrentaram pelo menos uma forma de exploração em sua nova vida, seja abuso do empregador, ataque sexual ou negação de salário, constatou o estudo.

Os migrantes —a maioria dos quais se muda para Estados como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Omã— ficam presos em uma forma de “escravidão moderna” após contrair empréstimos ou vender terras para pagar os US$ 4.021 (cerca de R$ 23 mil) que normalmente precisam custear para garantir trabalho no exterior, disse o Instituto Internacional para Meio Ambiente e Desenvolvimento (IIED).

O think tank com sede em Londres conversou com 648 famílias para entender como as mudanças climáticas impactaram aqueles que vivem na linha de frente.

Em movimento

A migração acelerou nas últimas duas décadas à medida que o planeta se torna cada vez mais quente, privando as pessoas de uma vida segura, futuro estável ou renda confiável.

O estudo descobriu que famílias em regiões propensas a desastres agora têm 1,6 vez mais chances de se mudar dentro de Bangladesh e 2 vezes mais chances de se mudar para o exterior em comparação com famílias que vivem em lugares mais seguros. Até 88% das famílias enviaram alguém para o exterior na última década, em comparação com apenas 9% de 2001-2010 e 4% na década de 1990.

Bangladesh é o sétimo país mais vulnerável do mundo aos impactos das mudanças climáticas, e desastres frequentes —de inundações a ciclones— estão causando um impacto crescente.

Os custos econômicos dos desastres relacionados ao clima quadruplicaram —de cerca de US$ 146 milhões (R$ 836 milhões) anuais durante 1960-1990 para US$ 558 milhões (R$ 3,2 bilhões) nos últimos 30 anos.

Isso custou a cada família na área costeira propensa a desastres mais de US$ 870 (cerca de R$ 5.000) por ano, disse o estudo, deixando as famílias com menos para os itens básicos da vida, como alimentação, educação ou saúde.

Entre os afetados estavam agricultores, comunidades pesqueiras e pequenos empresários cujos meios de subsistência eram frequentemente os mais atingidos, forçando-os a buscar melhores perspectivas em outros lugares.

No distrito de Pirojpur, na costa sul de Bangladesh, que enfrentou uma série de inundações e ciclones destrutivos nos últimos anos, o professor Abu Musa conta que enviou seu irmão mais novo para Daca para trabalhar como segurança depois que a monção do ano passado destruiu as plantações e as pescarias de sua família.

“Perdas repetidas por desastres tornam mais difícil sobreviver nos últimos anos —e você pode pelo menos ganhar uma renda estável quando consegue um emprego em um lugar como Daca”, disse ele à Fundação Thomson Reuters.

Mas muitos partiram apenas para enfrentar novos riscos e problemas em suas cidades adotadas —especialmente aqueles que se mudaram para o exterior.

O estudo disse que migrantes nas indústrias de construção e vestuário em grandes cidades tiveram compensação negada quando se acidentaram no trabalho, enquanto trabalhadores domésticos enfrentaram espancamentos ou alimentação e cama inadequadas.

Migrantes que se mudam para o exterior enfrentam riscos maiores, pois não têm escolha a não ser recuperar seus altos custos iniciais, disse Bharadwaj.

Empregadores frequentemente apreendem os passaportes dos trabalhadores e os impedem de deixar o local de trabalho, negando-lhes a chance de contatar suas famílias ou a embaixada, disse o estudo.

Mulheres sofrem mais: entre as trabalhadoras domésticas, mais de 80% enfrentaram abusos como espancamento ou assédio sexual em suas casas anfitriãs, constatou a pesquisa.

A quem recorrer?

Como o número de migrantes bengalis em países do Golfo chega a milhões, as embaixadas muitas vezes lutam para monitorar as condições ou realizar resgates, disse a OIT (Organização Internacional do Trabalho).

“A parte triste é que quando um trabalhador enfrenta abuso, muitas vezes não sabe a quem recorrer”, afirmou Mohammad Rashed Alam Bhuiyan, professor assistente de ciência política na Universidade de Daca que estuda migrantes climáticos bengalis.

O governo poderia terceirizar serviços essenciais —como assistência médica ou abrigo para aqueles em risco— para organizações privadas, sugeriu ele.

Ajudar as comunidades a minimizar as perdas relacionadas ao clima em casa também poderia reduzir o risco de abuso no exterior, disse Md Shamsuddoha, diretor executivo da organização de pesquisa com sede em Daca, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Participativo (CPRD, na sigla em inglês).

Se as famílias pudessem receber alertas antecipados de desastres, bem como apoio financeiro, estariam melhor informadas e poderiam ser mais propensas a ficar, disse ele.

Especialistas também apontaram para a complexa rede de corretores que ajudam os migrantes a conseguir trabalho, do Oriente Médio à Malásia.

Esses intermediários são frequentemente acusados de fraude ou engano, destacando a necessidade de melhor rastrear os migrantes, disse Bharadwaj do IIED.

“Não devemos pintar os agentes e corretores que apoiam a migração climática como vilões —em vez disso, o governo deve registrar todos os intermediários e trabalhar com eles para garantir padrões mínimos para os trabalhadores”, afirmou ela.

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