Mototáxi clandestino segue em atividade em SP – 14/02/2025 – Cotidiano

O serviço de mototáxi, que não tem regulamentação municipal e é considerado irregular, continua operando na cidade de São Paulo mesmo após a decisão da Justiça que suspendeu a oferta do serviço de carona em motos das empresas Uber e 99. Ele é oferecido por grupos de motociclistas autônomos e pode ser encontrado facilmente próximo de alguns terminais de transporte na periferia da capital.

Em Perus, na zona norte, um grupo de mototaxistas oferece caronas próximo à entrada da estação de trem do bairro. No extremo oposto da cidade, no Grajaú (zona sul), o mesmo ocorre em frente ao terminal de ônibus integrado à estação da linha 9-esmeralda de trens.

Os dois locais funcionam de forma semelhante a pontos de táxi convencional. Os motociclistas aproveitam o fluxo de passageiros que desembarcam da estação de trem para oferecer as viagens de moto.

Nesta quinta-feira (13), ao menos seis mototaxistas trabalhavam embaixo do viaduto Dona Mora Guimarães, próximo à estação Perus da linha 7-rubi. Além de oferecer viagens a quem circula na região, eles também são acionados por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp, segundo um dos mototaxistas que conversou com a reportagem.

“Deviam liberar isso aí, porque o serviço vai acontecer de qualquer jeito”, disse o motociclista Márcio Aparecido, 44, um dos que trabalham no local. Ele chegou a atender corridas pelos aplicativos Uber e 99, mas, com a proibição, voltou a depender dos grupos de WhatsApp e do fluxo de passageiros na estação. “Muito passageiro já me falou: isso [a oferta pelos aplicativos] foi a melhor coisa que já aconteceu.”

Aparecido conta que alguns de seus colegas já tiveram as motos apreendidas em fiscalizações da prefeitura, e assim não puderam mais trabalhar. A multa para liberá-las é de R$ 4.500. Ele trabalha com uma moto alugada e diz que, caso o veículo seja retido, não tem dinheiro para cobrir o prejuízo.

O grupo passou a oferecer o serviço no local há cerca de um ano, segundo duas pessoas que conversaram com a reportagem —um vendedor ambulante e outro mototaxista, que não quiseram ter o nome divulgado. O movimento de corridas no mototáxi em Perus é maior à tarde, no retorno de moradores ao bairro após o trabalho.

Um mototaxista disse que, nos casos em que condutores do grupo se envolveram em colisões leves e causaram dano a alguma veículo, houve arrecadação coletiva de dinheiro para pagar pelo prejuízo. Afirmou, porém, que nunca houve nenhum acidente grave em um ano de atividade.

O mototáxi funciona em meio a uma indefinição jurídica sobre o tema na cidade. Em 2022, uma decisão do TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo) cancelou os efeitos de uma lei municipal que proibia a atividade.

Na ocasião, a instância máxima do Judiciário estadual considerou que a lei invadia a competência do governo federal ao proibir o serviço, e julgaram era inconstitucional. Na prática, porém, o mototáxi continua proibido por outros mecanismos

A prefeitura não regulamentou o serviço após a decisão do TJSP, e por isso considera que ele permanece clandestino. Além disso há uma lei municipal de 2012 que proíbe o transporte individual remunerado de passageiros por qualquer veículo —carro, moto ou outro— que não esteja autorizado pela prefeitura.

É essa lei que serve de base para as apreensões de motos. A prefeitura já apreendeu 344 motocicletas neste ano.

O argumento usado pelos desembargadores, ao declarar que a proibição do mototáxi é inconstitucional, é o mesmo usado por 99 e Uber para defender que os aplicativos de carona em motos também não podem ser proibidos. As empresa, porém, alegam que o serviço que oferecem não é o mesmo que mototáxi —a diferença é a mesma dos táxis comuns e os carros de aplicativo, elas afirmam.

O aumento das mortes no trânsito é o principal argumento de quem defende a proibição do serviço. As mortes de motociclistas e passageiros foram responsáveis pela maior parte do aumento na letalidade nas vias da região metropolitana de São Paulo, já que cresceram em proporção acima da média de outros modais —como pedestres, ocupantes de automóveis, bicicletas, caminhões e ônibus.

Antes da pandemia, em 2019, as motos respondiam por 38% das mortes no trânsito na região. Em 2024, essa proporção chegou a 46%. Na comparação de 2022 a 2024, as mortes de ocupantes de moto cresceram 23% (de 777 para 957). Já as mortes no conjunto de todos os outros modais aumentou menos de 10% (de 1.003 para 1.103).

Os condutores de motos são as maiores vítimas do trânsito: quatro a cada dez mortos nas ruas da região metropolitana no ano passado conduzia uma motocicleta. As mortes de passageiros também cresceram, com 98 vítimas no ano passado, maior número da série histórica.

No Terminal Grajaú, na rua Giovanni Bononcini, há uma tabela de preços das corridas com mototáxi. Está afixada na parede ao lado da bilheteria do transporte público e mostra valores de acordo com o bairro de destino.

Corridas até bairros mais próximos, como o Jardim dos Manacás, saem a partir de R$ 10. Até a estação Santa Cruz, na Vila Marina, o custo é de R$ 50 —quase o mesmo valor de uma corrida na modalidade UberX, a mais barata oferecida pelos carros de aplicativo, na tarde da última quinta.

O serviço funciona no Grajaú há mais de três anos, como mostrou uma reportagem da Folha em 2022. Um dos motociclistas no local disse que a chegada das modalidades oferecidas por Uber e 99 não foi boa para os mototaxistas que já ofereciam o serviço no bairro, uma vez que passou a competir com quem já trabalhava ali. Ele não quis dar mais detalhes do serviço.

Por causa da chuva, passageiros que desembarcavam no Grajaú na tarde de quinta preferiam pedir carros de aplicativo para deixar o terminal.

Questionada, a Prefeitura de São Paulo afirmou que “realiza fiscalizações diárias para combater o transporte clandestino” e ressaltou que a atividade é proibida pelas leis municipais 15.676/2012 e 16.344/2016.

“As equipes de fiscalização atuam em diferentes períodos do dia para verificar veículos não autorizados que transportam passageiros, garantindo o cumprimento das normas legais”, diz o Departamento de Transportes Públicos (DTP). “Em janeiro deste ano, 14.088 veículos foram fiscalizados pelo Departamento e 344, apreendidos por irregularidades ou prática de transporte clandestino, além de multas aplicadas. Denúncias sobre o transporte irregular de passageiros podem ser realizadas pelo Portal 156.”

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