O futuro do SUS – 26/02/2025 – Saúde em Público

No debate sobre a reforma ministerial, a saúde tem sido tratada como um dos temas mais relevantes pela possibilidade de deixar uma marca importante do governo junto à população. Por certo, há, no curto prazo, uma forte demanda por serviços públicos de saúde que precisa ser atendida. No entanto, é preciso ter um olhar de longo prazo. A melhoria da prestação dos serviços de saúde, sabe-se, é um processo contínuo e que ultrapassa, necessariamente, vários governos.

O desafio, portanto, é assegurar que decisões e ações tomadas hoje garantam, ao longo do tempo, o direito à saúde, conforme estabelecido na Constituição brasileira.

Ora, tomar decisões e implementá-las na administração pública é uma questão complexa e envolve interesses diversos, que se materializam em uma disputa na sociedade por suas políticas e orçamentos.

Para garantir os interesses dos usuários do SUS nessa disputa, as políticas de saúde devem ter o apoio da população e, em particular, de atores sociais com capacidade de interferir na sua formulação e implementação. No caso da saúde, a construção desse apoio passa, necessariamente, pelo desenvolvimento de três competências fundamentais para a gestão do SUS: a liderança política do Ministério da Saúde, a qualificação na gestão dos recursos e a mobilização social.

Liderança política e gestão de recursos qualificada

A liderança do Ministério da Saúde é crucial para coordenar e articular os vários interesses em torno das políticas e do orçamento. Assim, a capacitação política e técnica das lideranças do sistema de saúde se consolida como a mais importante competência a ser observada no debate sobre o futuro do SUS, considerando seus reflexos óbvios na gestão dos recursos e no desenvolvimento de ações de mobilização social.

Não menos importante é a capacidade da gestão pública de transformar os recursos disponíveis para a saúde em serviços eficientes e de qualidade. Milhões de usuários do SUS têm um contato diário com os serviços prestados pelo sistema de saúde e esse contato pode fortalecer ou enfraquecer a imagem do SUS, dependendo da qualidade do atendimento. Assim, o debate sobre a melhoria da prestação de serviços de saúde inclui as regras de gestão e controle da administração pública.

O atual marco regulatório administrativo e de controle do setor público tem ênfase em processos e não em resultados. Essa concepção incentiva uma burocratização excessiva dos processos de trabalho, limita a criatividade e a iniciativa dos servidores públicos, restringe a tomada de decisão e a execução e fragiliza juridicamente os técnicos e gestores frente aos órgãos de controle. Como consequência, aumentam o custo e o prazo das entregas, implicando em uma redução da oferta de serviços de saúde em prejuízo aos usuários e à imagem do SUS.

O futuro do SUS é uma obra coletiva

A terceira competência a ser desenvolvida é a capacidade de promover a participação social da população brasileira. A construção do futuro do SUS é uma obra coletiva, e o poder público deve reconhecer e incentivar a participação da sociedade civil na construção de soluções e na defesa política do SUS. A flexibilidade na mobilização de recursos financeiros, humanos e materiais, por exemplo, é um diferencial importante da sociedade civil em relação ao setor público, que pode inspirar projetos inovadores e a qualificação da gestão no âmbito da saúde pública.

Durante a pandemia de COVID-19, vimos a importância do apoio da sociedade às políticas de saúde, com o SUS vivenciando um momento inédito e grandioso de aprovação popular. No entanto, essa boa imagem poderá se deteriorar se a sociedade não receber um atendimento de qualidade e não tiver acesso a informações que lhe permitam avaliar adequadamente a prestação dos serviços.

O retorno do Índice de Desempenho do SUS (IDSUS) poderá ajudar no fortalecimento do apoio da sociedade, em função da transparência que proporciona às políticas de saúde e do estímulo ao debate público.

Por fim, é preciso lembrar que o Estado tem a responsabilidade de resolver os problemas da vida cotidiana da população. Prover acesso de qualidade aos serviços de saúde está, assim, relacionado à legitimidade do Estado e, portanto, à percepção de fortalecimento da democracia.

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Ricardo de Oliveira é engenheiro de produção e foi Secretário Estadual de Gestão e Recursos Humanos do Espírito Santo entre 2005 e 2010 e Secretário Estadual de Saúde do ES de 2015 a 2018. É autor dos livros “Gestão Pública: Democracia e Eficiência” (FGV/2012) e “Gestão Pública e Saúde” (FGV/ 2020). É membro do Comitê de Filantropia da UMANE.


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