Opinião: Voar ficou mais perigoso? – 25/02/2025 – Cotidiano

Realizado em 2024, um estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) concluiu que o risco de alguém falecer em um voo na aviação comercial norte-americana é de 1 a cada 13,7 milhões de embarques. Os dados se referem a cálculos efetuados entre 2018 e 2022. Os números, que já eram ótimos, mostram uma clara evolução. Outra pesquisa, realizada com voos entre 2008 e 2017, registra uma morte a cada 7,9 milhões de embarques.

O acidente acontecido recentemente em Washington foi o primeiro fatal envolvendo aeronaves comerciais nos Estados Unidos desde 2009. No ano passado, registraram-se mais de 1000 acidentes de aviação em todo o mundo, com diferentes níveis de gravidade, dentre os quais 199 foram mortais.

Este número contrasta com os mais de 48 milhões de horas de voo registradas em 2023, cumprindo nada menos que 35,3 milhões de voos comerciais regulares em todo o mundo. Em 2024, o número de passageiros transportados pelas companhias aéreas em todo o mundo foi de 4,7 bilhões.

Aproveitando que os ianques são bons em estatísticas, veja mais esta: a cada ano morrem nos Estados Unidos, em média, de 72 a 100 pessoas picadas por abelhas e marimbondos. Donde se conclui que o perigo não está no aeroporto, mas pode estar no seu quintal.

Ficou mais calminho? Eu sei que não. Se o MIT usasse seus recursos de pesquisa para mensurar o nível de medo, estresse e ansiedade dentre os passageiros nos dias de hoje, certamente iria mostrar um resultado inversamente proporcional aos ganhos na segurança.

Então, por que tem tanto avião caindo? Fato é que nunca se voou tanto como agora. Mas não há explicação matemática, estatística, sazonal, cultural ou meteorológica para explicar essa sucessão de acidentes nos últimos meses. Voar ficou mais perigoso? Não, absolutamente não. Pelo contrário, a indústria, de forma global, a cada ano fica mais segura, com menos acidentes, menos fatalidades a cada ocorrência.

Mas um fator, que é tendência irreversível, muda a nossa percepção sobre segurança no transporte aéreo. Existem atualmente mais de 7,2 bilhões de celulares em todo o mundo e esse número só faz crescer. Ou seja: qualquer ocorrência aérea, por menor que seja, vai ser filmada, gravada e disseminada, com o perdão do trocadilho, a jato, alcançando bilhões de amedrontados potenciais passageiros em velocidade supersônica.

E esse é o fator que, na minha opinião, faz com que o terráqueo-padrão se mostre cada vez mais desconfiado, amedrontado: é a percepção. Nunca se mostrou, como hoje se vê quase em tempo real, uma sucessão de acidentes aéreos semelhante ao que experimentamos nos últimos meses.

Ora, poucas coisas são mais impressionantes do que assistir a queda de uma aeronave. Eu já vi, ao vivo. Fiquei meses com aquela cena na minha mente.

Nos últimos dois anos, mais de três quartos dos acidentes aéreos ocorridos, seja em voos civis, militares ou na aviação geral, foram registrados e, em seguida, viralizaram pelas redes sociais, antes mesmo que as empresas operadoras, familiares dos ocupantes ou autoridades responsáveis pela segurança ou investigação tivessem conhecimento das respectivas tragédias.

Um passageiro de uma aeronave que caiu no Nepal filmou e exibiu sua própria morte nas redes sociais: estava a bordo, fazendo streaming enquanto a aeronave despencava sem deixar sobreviventes.

Vem aí a minha conclusão, que mostra um paradoxo: se voar nunca foi tão seguro, a percepção é justamente o oposto: os acidentes aéreos nunca foram tão registrados e universalmente exibidos como são hoje. Pior: são divulgados imediatamente, sem qualquer filtro, acrescidos de comentários que nada têm de lúcidos ou respeitosos, normalmente acompanhados de conclusões apressadas ou acusações descabidas. E aí não há MIT que te convença.

Encerro com uma frase de meu finado pai, que era jornalista e articulista aqui na própria Folha. Ele voava muito a trabalho e certa vez lhe perguntaram: “Joelmir, você tem medo de voar?” Ele pensou um pouquinho e disse: “Não, não tenho medo de voar. O que me dá realmente medo é o carro que me leva até o aeroporto.”

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